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“Abaixo de Deus, é ela, a feira, que me dá o pão de cada dia”, afirma a feirante Marilene dos Santos, da Central de Abastecimento


25 de agosto de 2018, 09:10

De onde vem a salada fresca que vai parar na sua mesa na hora do almoço? E a farinha, o feijão, o aipim cozido do fim de tarde? Pode ser que o produto que enche o seu prato não tenha exatamente a mesma origem da mercadoria que abastece a dispensa de João, a mesa de Francisco, ou a cesta de Antônia, mas, na contramão do produto industrializado ou das grandes filas de supermercado, são as feiras que fornecem, suprem e alimentam milhares de pessoas todos os dias no Brasil.

Se a concorrência com as grandes redes de comercialização não parece justa e a crise econômica não favorece, os profissionais do setor resistem e apostam diariamente no frescor do alimento, na qualidade do produto e no traquejo do atendimento cuidadoso para conquistar o público.

Se funciona? Desde 25 de agosto de 1914, quando 26 feirantes realizaram a 1ª Feira Livre do Brasil, no Largo General Osório, estado de São Paulo, o hábito de vender diretamente ao consumidor virou tradição regulamentada em lei.

Imagem: Heloisa Gomes/SECOM

São doces, pescados, carnes, frutas, verduras, temperos, utensílios, roupas e produtos diversos comercializados em todas as cidades brasileiras por profissionais que, durante esses mais de 100 anos, se estabeleceram, se adaptaram e se reinventaram na arte de vender.

Em Alagoinhas, a maior parte dos feirantes da cidade – todo mundo sabe – se concentra na Central de Abastecimento (CEAB). Com setores de hortifruti, confecções, calçados, flores, lanches, cereais, carnes, artesanatos e construções, a Central conta atualmente com mais de 2.300 feirantes cadastrados.

Imagem: Ana Maria Simono/SECOM

Gente como S. João, que contabiliza, em anos de trabalho como feirante, quase a idade da CEAB no município. Aos 71 anos e cheio de energia para comercializar os produtos na feira, João de Oliveira garante que não quer parar. “Eu comecei a comercializar tem mais ou menos uns 30 anos. Eu vim desde a feira lá de cima pra cá. O que eu planto é um quiabinho, uns pés de milho, mamão, que muitas vezes nascem no quintal. Eu sou aposentado. Agora eu tenho minha barraca aqui para ajudar em algumas coisas, sabe como é? E também para fazer uma terapia no corpo, porque eu aqui me sinto melhor do que em casa. Ficar em casa parado não é bom, que eu já sou muito acostumado a movimentar. A feira para mim é uma distração e também uma renda”, comentou.

Para Marilene São Pedro dos Santos, de 45 anos, não é diferente. “Como dizia o povo de antigamente, trabalho assim ‘desde quando nasciam os dentes’. Comecei com uns 15 anos, trabalhando para os outros”, afirmou.

Imagem: Heloisa Gomes/SECOM

Agora Marilene tem a própria barraca e trabalha com uma ajudante na atividade que a ajuda a manter os três filhos, de 5, 9 e 11 anos estudando. “Rapaz, eu já me acostumei nessa feira, viu? Abaixo de Deus, é ela, que me dá o pão de cada dia. Não é como eu imaginava, porque aqui é um jogo, tem semana que a gente ganha, tem semana que a gente perde, e vamos vivendo um dia após o outro. Porém, é de onde eu tiro o meu sustento e dos meus 3 filhos, daqui da feira”, enfatizou.

Criada na década de 80, a CEAB ainda está distante do ideal de estrutura física para abrigar quem comercializa os produtos no local, mas o secretário de agricultura do município, Geraldo Almeida, destaca que, embora não tenha passado pela revitalização total necessária, a CEAB passou, nesta gestão, por mudanças significativas. “Quando assumimos a Central, encontramos um espaço em estado de deterioração muito grande. Era um local que estava sendo muito maltratado, negligenciado no cumprimento do regimento, sem controle, sem comando, com portões abertos dia e noite. A situação era degradante. Evidente que ainda existe muita coisa a ser feita, que os galpões precisam ser completamente revitalizados e que há questões importantes ainda para serem tratadas, mas temos nos empenhado em fazer um trabalho de melhoramento e quem freqüenta o local diariamente sente a diferença”, explicou.

Desde que assumiu a pasta, a Secretaria de Agricultura (SEMAG) iniciou a reforma dos sanitários, fez a desobstrução de calhas, substituiu mais de 200 lâmpadas para a melhoria da iluminação, realizou uma revisão parcial da rede elétrica, estabeleceu o horário de funcionamento dos portões, reforçou a segurança e realizou operações conjuntas com outros órgãos municipais para garantir e orientar proprietários de bares sobre horários de funcionamento no local.

O desafio para garantir melhorias, segundo o secretário, é diário, mas a equipe tem se empenhado para trazer soluções efetivas que transformem os galpões em ambientes favoráveis à comercialização. “Sabemos que precisamos ainda de melhorias para o aproveitamento dos espaços, para a estrutura e para a organização. É com foco nesses avanços que temos trabalhado. E já temos um recurso aprovado da Caixa Econômica Federal da ordem de 3 milhões de reais apenas aguardando a licitação para que possamos iniciar a requalificação completa do mercado popular de confecções no local”, garantiu Geraldo Almeida.

E, embora ainda esperem essas melhorias estruturais que favoreçam os setores e contribuam para a comercialização dos produtos, os trabalhadores continuam acreditando na feira que abastece as mesas das famílias em todas as regiões da cidade.

Imagem: Ana Maria Simono/SECOM

Edna de Souza tem mais de 3 décadas na feira: desde os 9, acompanhava o pai no dia a dia de ir e voltar à Central, e o trabalho, que passou de pai para filha, se tornou não apenas hábito, mas memória, história construída e compartilhada em família. “Ele faleceu. Hoje estamos eu, minha irmã e meu esposo. Nós não temos roça, nós compramos roça. A gente chega 6h, 6h30, sai 18h. É muito bom, é divertido. Conhecemos pessoas, passamos informações sobre frutas, verduras, o que pode, o que não pode para uma dieta. Aprendi tudo com meu pai e com os fregueses”, pontuou.

O que a feira representa para ela, depois de uma trajetória de 30 anos de ‘vai e vem’ na Central de Abastecimento da cidade?

“Muita lembrança e muita emoção, por causa do pai. Tem 16 anos falecido, mas é como se fosse hoje. Tenho uma filha de 18 anos, feirante também”, disse Edna de Souza, cheia de orgulho.

A atividade, que atravessa gerações, deixa marcas positivas na história contada e na história viva, do local que, desde 1988, mantém o movimento de escoamento da produção. “A Central é um importante mercado popular que abastece grande parte da população de Alagoinhas. É um espaço tradicional, que está enraizado na cultura popular. É em função dessa importância que nos preocupamos e que temos nos empenhado para recuperar e trazer melhorias aos espaços interno e externo da CEAB”, finalizou o secretário Geraldo Almeida.

Imagem: Heloisa Gomes/SECOM

A SEMAG parabenizou as Marilenes, as Ednas, o João e todos os outros feirantes pelo seu dia e pelo trabalho incansável que essas pessoas vêm realizando há décadas para manter abastecida a mesa do cidadão alagoinhense. A Secretaria informou ainda que deve fazer uma comemoração formal na terça-feira, dia 28 de agosto, com palestras do SEBRAE sobre micro empreendedor individual, do Banco do Nordeste sobre operações de micro crédito para feirantes e do IFBaiano quanto à manipulação de alimentos para a comercialização na feira.

O secretário Geraldo Almeida aproveita a oportunidade para escutar as principais demandas apontadas pelos feirantes e para falar sobre as melhorias e projetos em curso para a Central de Abastecimento da cidade. O evento será realizado no IF Baiano, a partir das 8h.

 

 

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